Retalhos Como Francisco e Clara de Assis, a Fraternidade a todos saúda em Paz e Bem!Retalhos

5 de janeiro de 2017

Plano de Vida e Acção 2017

Ordem Franciscana Secular
Fraternidade de S. Francisco à Luz
Mosaico de Maria Ludgera Haberstroh ilustrando o Cântico das Criaturas,
na Liebfrauenkirche, Innenhof

Plano de Vida e Ação 2016/2017
Tema: A Alegria do Amor: Viver como Irmãos
Todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum” (At. 2, 44)
Objetivos:
1.    Promover o espírito fraterno entre os irmãos da fraternidade;
2.    Aprofundar a vivência do carisma franciscano;
3.    Refletir sobre o serviço e a entrega ao outro;
4.    Celebrar a vida em Fraternidade, exercer a misericórdia, viver em comunhão e na partilha;
5.    Acolher e acompanhar todo e qualquer irmão da Fraternidade.

A Alegria do Amor: Viver como Irmãos
Todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum” (At. 2, 44)
                O livro dos Atos dos Apóstolos tem como grande objetivo oferecer-nos uma espécie de “retrato” daquela que era a comunidade cristã das origens. São Lucas vai descrevendo essa comunidade numa perspetiva que se vai alargando, tomando como itinerário dessa expansão a caminhada de Paulo e dos seus companheiros de missão. Os primeiros capítulos dos Atos são dedicados à comunidade nascente, aquela que, na esteira de Jesus e dos Apóstolos, inicia a vivência da mensagem agora já sem a presença física e visível do Mestre. Formando um todo, com o Evangelho, devemos olhar para o texto do livro dos Atos como a 2ª parte de um grande projeto em que o seu autor, tal como ele mesmo o refere no prólogo (At 1,1-11), procura mostrar esta continuidade no que diz respeito ao plano de Jesus de que a comunidade das origens é o garante e a testemunha vivencial, já assumida no contexto do Novo Testamento.
                É neste enquadramento que devemos situar e fazer a nossa aproximação aos textos dos primeiros capítulos dos Atos, mormente a partir de 1,12, onde nos é apresentada a “Comunidade de Jerusalém”. Deste conjunto de textos e narrativas, sobressaem aquelas que dizem respeito à vivência dos primeiros cristãos convertidos à fé em Jesus, na sua maioria de origem judaica. O quadro que nos é oferecido por Lucas, personalidade de grande sensibilidade cultural e humana, faz-nos sentir como os ideais da fé eram vividos num clima de grande intensidade. Podemos dizer que Lucas, companheiro que fora de S. Paulo, tinha-se deixado tocar pelo ideal evangélico que tão profundamente marca a conversão do “Apóstolo das gentes”, capaz de centrar em Cristo todo o plano da salvação, passando da radicalidade da Lei mosaica, típica da ideologia farisaica em que fora formado, para uma paixão envolvente em Cristo à qual tinha aderido. Lucas, marcado por esta experiência radical de Paulo, deixa-se também ele tomar por essa radicalidade evangélica que se cruza muito bem com aquilo que eram também os ideais de vida do grupo dos “Pobres de Yahwé” que aguardam a irrupção do “Reino de Deus” e para o qual se devem preparar.
Nos últimos decénios do séc. 1º aC, assim como no período em que decorre a vida de Jesus, tinha despertado no âmbito do judaísmo uma grande tensão escatológica e apocalíptica que desencadeara um clima de grande exigência e austeridade, mormente no que diz respeito ao uso dos bens temporais e à partilha de recursos humanos, já que a sociedade judaica tinha sofrido um grande empobrecimento. A mensagem de Jesus, em vários textos evangélicos, faz-se eco desse ambiente de austeridade e de urgência na partilha de bens temporais. A tradição rabínica e os ecos da literatura judaica extra bíblica ajudam-nos a constatar este clima social e religioso que então atravessava a sociedade do tempo.
É neste contexto que se enquadra também a resposta cristã que comporta duas dimensões fundamentais; por um lado, o movimento cristão das origens assume também ele esta radicalidade que, aliás, S. Lucas deixa já transparecer nos chamados “Evangelhos da infância”, mormente nos cânticos do Benedictus (Lc 1,67-79) e no Magnificat (Lc 1,46-55) e nas personagens que compõem esses quadros evangélicos: Isabel, Zacarias, Maria, os pastores, assim como os dois anciãos, Simeão e Ana. A dimensão teológica destes textos que nos apresentam a Comunidade cristã de Jerusalém procura assim mostrar-nos como a radicalidade da conversão implica uma série de opções que devem ter reflexos concretos no modo e na forma de vida dos crentes.
Várias dessas opções estão bem expressas e definidas nos objetivos traçados para o Plano de Vida e Ação da Fraternidade para 2016/17. É verdade que o ideal definido para este Plano – “Todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum” (At. 2, 44) – é uma meta em busca de concretização, muito bem adequada à vivência do “Ano da Misericórdia” cujos valores e propostas vão continuar a fazer parte da nossa identidade cristã e franciscana. Por isso, o regresso às fontes franciscanas e ao Evangelho faz parte do desafio constante a que somos interpelados a dar resposta. Não devemos sentir este ideal como uma meta impossível, mas antes como uma interpelação que é, hoje, a nossa forma de experimentar a temporalidade e a fragilidade da nossa condição humana, que passa pela conversão constante ao Evangelho.
Padre João Duarte Lourenço, OFM
 
 Wenzel Hollar: São Francisco em retiro, século XVII. Universidade de Toronto


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